Luiz Ernani Fritoli (fritoli@ufpr.br)
Boas, poucas, loucas, mas mais más: as mulheres de Dante.
Descrição: As mulheres são minoria na Divina Comédia; dentre as centenas de personagens humanos encontrados ou citados por Dante ao longo das três cânticas da obra, a imensa maioria é constituída por homens – nenhuma novidade até aqui. Mas a importância das mulheres não é – não deve ser – medida pelos números. Algumas das principais personagens da Comédia são mulheres: Beatriz, protagonista absoluta, Francesca da Rimini, uma das mais conhecidas, talvez inclusive a mais conhecida e lembrada depois de Beatriz; santa Luzia, santa Maria, Dido, Cleópatra, a prostituta Raab, a misteriosa Matelda, sacerdotisa do Paraíso Terrestre, Pia dei Tolomei, Piccarda Donati, a maga Manto, a rainha Semíramis, Helena de Troia, rainhas e imperatrizes, e tantas outras.
Cada uma delas escolhida com consciência, racionalmente, com um objetivo específico: representar um tipo social, presentificar uma memória histórica ou mitológica, exaltar qualidades, censurar defeitos, denunciar violências, fazer refletir, provocar emoções. Cada nome traz consigo uma história, uma moral, um exemplo – nem sempre facilmente interpretáveis. Muitas vezes a própria riqueza semântico-poética do texto permite – ou exige – leituras múltiplas, não raro contraditórias, do valor histórico, cultural, intelectual, religioso, implícito na escolha e na forma da representação da personagem feminina. Não raro o conservador, frio e racional poeta florentino parece se deixar comover pela ternura ou pela dor de personagens femininas, via de regra apresentadas como frágeis e dependentes. Mas uma análise mais profunda e imparcial pode mostrar que não há lugar para a primazia da emoção na concepção e na construção poética das personagens; há frieza, cálculo, objetivo. Dante é poeta absolutamente racional.
O objetivo desta pesquisa é justamente o de mapear o universo feminino da Divina comédia, elaborando uma espécie de catálogo das personagens, divididas por cântica, por pecado/virtude, por categoria (histórica, mitológica, literária, nobre, plebeia, etc.), trazendo à luz suas biografias, histórias, valências socioculturais, estabelecendo relações entre elas e com suas contrapartes masculinas, buscando esclarecer ao máximo possível as escolhas e os processos realizados por Dante.
Palavras-chave: literatura italiana; Dante Alighieri; Divina Comédia, mulheres na literatura.
A verdade da língua revelada: o logos poético na Comédia de Dante
Descrição: A liberdade que Dante vai procurando ao longo de sua longa jornada é liberdade das cadeias do vício, do pecado, da inveja, da cobiça; é liberdade intelecual, liberdade política, liberdade ética; também liberdade de corpo, de ir e vir, mas sobretudo liberdade espiritual, que se manifesta como liberdade de expressão do próprio espírito. Em síntese, nas muitas formas e manifestações, Dante busca uma liberdade que não é garantida pelas instituições, que não advém do poder da força, mas da Verdade. Da Verdade que só se encontra em Deus, princípio, meio, fim e essência eterna. Coincidindo com Deus ? como dita o preceito tomista ? porém, a Verdade é inefável, incompreensível em sua infinitude, para a limitada mente humana; é, portanto, inexprimível. Mas Dante não se rende diante do impossível; se não existe a língua filosófica ou teológica ou poética que possa exprimir a Verdade última neste mundo, é preciso buscá-la no Além. Este é justamente o processo de sublimação perseguido por Dante em sua Divina Comédia: passar do domínio da língua comum da teologia, da filosofia, e mesmo da grande poesia (especialmente em suas matrizes tomista e virgiliana), capazes de exprimir as verdades limitadas do espírito, ao domínio da língua nova, palavra e razão divinas plasmadas em sua palavra poética, como única Verdade da razão último: logos poético..
Entre artes e ciências: as (re)formas do romance italiano do pós-guerra
Descrição: O presente projeto consiste em uma investigação sobre as formas originais que o romance italiano assume na segunda metade do século XX, buscando as possíveis influências, intertextualidades, contaminações interculturais e demais fatores que induziram a inúmeras inovações da já então (por muitos considerada) exausta forma do romance. Nesse período, mais intensamente do que antes, torna-se praticamente regra de arte buscar uma renovação das estruturas e das linguagens, e os autores recorrem tanto às estéticas de outras artes como a elementos das ciências (paradigmáticas ou pré-paradigmáticas) como substratos possíveis e passíveis de interação com a literatura. O resultado disso é que não só elementos da pintura, música, cinema, teatro, dança, mas também elementos da matemática, da física, química, biologia, astronomia e astrofísica, arqueologia e antropologia, psicologia e psicanálise, informática e geometria, entre outras, aparecem como temas, mas principalmente como forma, ou estrutura nos romances de muitos autores, dos quais citamos, apenas como exemplos: Italo Calvino, Carlo Emilio Gadda, Cesare Pavese, Primo Levi, Carlo Levi, Dino Buzzati, Leonardo Sciascia, Umberto Eco, Antonio Tabucchi, Pier Vittorio Tondelli. Estruturas, linguagens, ritmos, processos, conceitos até então minimamente presentes ou alheios à literatura passam a desempenhar função ordenadora na construção da obra literária. O objetivo fundamental da pesquisa é o de mapear, na medida do possível e sempre apontando no texto literário em exame as incidências interestéticas, e refletir sobre suas causas interepistemológicas, visto que entendemos a literatura não como um fato isolado, mas sim como uma manifestação cultural absolutamente interagente com todas as outras manifestações culturais, sociais, históricas. Nenhuma literatura se produz fora da sociedade nem fora da história; procurar-se-á então estabelecer as relações pertinentes a cada produção individual de um autor com seu tempo, lugar, história e sociedade, bem como, naturalmente, com a experiência biobibliográfica do próprio autor, para, a partir daí, tentar explicitar e quanto possível esclarecer a motivação, a coerência, a lógica interna das inovações produzidas na forma do romance.